Hoje são 02 de maio de um ano que nem sequer começou direito, do ano de 2020. São tantas questões que se colocam para refletir e pensar neste momento, mas pra começar, precisávamos escolher uma. E chegamos à conclusão, a educação para além do acesso remoto.
Não precisava ser professora para saber todos, ou quase todos os problemas que existem referentes ao sistema educacional em nosso país, principalmente agora, nesse momento tão delicado. Acredito que ninguém da minha geração imaginou viver uma “pandemia planetária”. E essa ideia de falar sobre isso não surgiu porque estamos em casa confinadas, apenas colocando a conversa em dia por redes sociais, pelo contrário, surgiu por estarmos imersas a uma gama de afazeres e demandas de trabalho, talvez nunca antes experenciados por muitos e muitas de nós, pelo menos nessa composição do Acesso Remoto, e em outros casos, a Educação a Distancia (EAD).
Com a pandemia do Covid-19 várias discussões vieram à tona, dentre elas, dúvidas e anseios. Os órgãos competentes ligados à educação começaram a articular toda uma logística sobre o que deve ou pode ser utilizado nos seguimentos educacionais. Estas discussões levantam questões muito pertinentes, tais como o uso da EAD para suprir as aulas presenciais. Qual é a grande questão? A grande questão é: todas as pessoas (crianças, jovens e adultos) possuem condições, acesso a internet e meios digitais? Esta alternativa supre as diversas necessidades ou todas as demandas que a educação exige? Será que de alguma forma, não estamos, mais uma vez, delimitando quem pode ou não pode ter acesso? Ou isso é reflexo de uma desigualdade social eminente no nosso país que a pandemia evidenciou ainda mais? Essas e muitas outras questões de extrema relevância se tornam urgentes na pauta da educação, sendo mais comprovadas nesse momento, e não poderia ser diferente, por todos os fatores que conhecemos.
A metodologia do Ensino a Distância é uma possibilidade e um caminho, e embora seja eficiente, não tivemos tempo de aprender e nos preparar. A EaD representa a inovação, a tecnologia e o acesso à Educação. Desde sua origem foi criada com a finalidade de dar acesso. No entanto, nossa realidade social não é assim estruturada, e a adaptação precisava ter sido pensada e analisada com cuidado, mas não tivemos tempo. As exigências foram impostas e essa preocupação legítima pode ser mais agravada pela “Guerra” Ideológica e cultural instaurada mesmo antes da pandemia, tornando-se agora um grande pavio de pólvora.
E além de tudo isso, os “bastidores” desse cenário não são pontuados. Trata-se do “ser humano e suas fragilidades”, discentes e docentes vivenciam de forma mais efetiva e afetiva suas emoções, tristezas, preocupações, inseguranças, ansiedades, entre outros sentimentos que estão à flor da pele. Não, não estou falando mais de preparar material, conhecer plataforma, estudar estratégia, estudar o conteúdo, formular questões... Não, não são estas funções que me refiro agora. Estou falando do oficio da professora enquanto “lugar de paz”, espaço de “escuta”.
Para além de todo o cenário retratado, agora no final de abril começamos a atender ligações e receber mensagens revelando uma nova estatística do governo, a que vem com nomenclatura. Os números se tornaram nomes. São mães, pais, filhas, filhos, tias, tios, avós, avôs, amigas, amigos... Agora, no final de abril, percebemos que no exercício da nossa função não chegávamos apenas na casa dos (as) nossos (as) alunos (as). Não mais víamos “só” os detalhes da casa ou conhecíamos a família, agora entramos na categoria de quem conforta, de quem escuta, de quem se configura de esperança, de quem se transforma em confiança... Nossa função agora se reveste de humanidade.
Esse exercício de compartilhar, de doar e de construir conhecimento, mesmo já fazendo parte da rotina dos professores e professoras, agora se amplia em um processo muito maior e muito mais humanizado. Nosso olhar se expande a cada ausência na tela do computador. E não é diferente das tecnologias que estamos aprendendo a usar, estamos aprendendo quem somos por dentro. Estamos aprendendo de maneira intensiva sobre o “outro”, sobre “respeito”, sobre “dores”, sobre esse “amor tão desmedido”, na verdade nem sabemos explicar muito bem.
Nossa função de construir conhecimento se ampliou para além do acesso remoto. Estamos experenciando filosofias estudadas uma vida inteira. Testando teorias e entendendo que muito mais amplo que nosso conhecimento teórico e prático de formação é a nossa capacidade de “olhar” o outro. Não me refiro a “ver”, me refiro a olhar. Olhar com cuidado, olhar com respeito, olhar com solidariedade. Nossa função agora se transformou em um exercício constante de aprendizado. Estamos aprendendo sobre limites, controle, respeito e companheirismo. Estamos enfim, aprendendo muito mais sobre pessoas. Essas questões muitas vezes ficam perdidas ou despercebidas na correria constante dos nossos dias, mediante a grande demanda de atribuições, e na Educação, seja pública ou privada, ensino básico ou superior, não é diferente.
E o futuro? Não fazemos ideia do que será o futuro. Sabemos que iremos enfrentar o trauma Pós-Covid-19. Ninguém colocou na agenda de 2020 tamanha excepcionalidade ou se preparou para enfrentar esse caos que o mundo vivencia. Lidamos com a incerteza de tudo, com a fragilidade e os medos. São tantas particularidades para poucas prioridades que a professora de história sai do tangível e mergulha no intangível, se tornando a “linha de frente”, que mesmo se sentindo impotente cuida da fragilidade do outro. Ressalto que esta não é uma práxis que encontramos em livros ou artigos acadêmicos, nem para isso estávamos preparadas, por isso a intenção não foi de produzir um texto com citações de teóricos e pesquisadores da educação e áreas afins, mas expressar o que estamos vivendo, sentindo e percebendo em nós, professoras e no outro, nossos (as) alunos(as) e suas famílias. É no espaço de trabalho, no ambiente educacional, que todas as fragilidades sociais em suas mais diversas faces, desaguam, e como em curso contrário, grita e implora para voltar ao seu fluxo natural. E quem somos nós? Somos apenas, professoras, para além do Acesso Remoto.
Cinthia Cecília de Lima
Graduada em História e Especialista em História da Paraíba
Professora de História da Educação Básica
Professora de História da Educação Básica
Presidente da ONG Memória Viva
Membro com conselho Municipal de Educação
Membro com conselho Municipal de Educação
Márcia de Albuquerque Alves
Graduada, Especialista e Mestra em História
Professora do Ensino Superior Privado
Membro da Academia Paraibana de Letras,
Ciências e Artes do Vale do Mamanguape - ALCA
Ciências e Artes do Vale do Mamanguape - ALCA
Como é bom ver mulheres contribuindo tão fortemente na literatura atual e compartilhando experiências tão importantes.
ResponderExcluirAna, gratidão pelo comentário e leitura. Estamos convidando outras professoras para também compartilhar conhecimento. Venha sempre que puder. Gratidão.
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