quinta-feira, 7 de maio de 2020

Desafios de uma tia, aprendendo e reaprendendo


Modelo de cartão-de-visita | Vetor Premium

Sou Pedagoga, Especialista em Educação Infantil, Professora da Educação Infantil e Fundamental Menor com experiência há mais de 20 anos. Escolhi esta profissão por ser a que eu gostava, desejava. Nunca fui muito adepta do uso da tecnologia, a não ser quando fosse um recurso necessário.

A educação infantil e fundamental menor requer a experiência do toque, do olhar, das sensações, educamos para além do “formal”. Tratamos da educação intelectual e emocional da criança. Atuamos com aprendizados que estimulam os sentidos. Trabalhamos o percorrer das letras e o equilíbrio do corpo. Nosso trabalho é efetivamente uma base, um preparo inicial. E nesta dinâmica, nos percebemos de um dia para o outro, enquanto um profissional que precisava se reinventar totalmente. Nossos estudos, nossos teóricos, aprendizados e experiências precisavam nos dar um suporte. Tudo que era tão manual precisava invadir outro universo, o virtual. Precisávamos estar juntos, mesmo que distante.

Neste contexto, de um dia para o outro precisei entender que a minha sala de aula seria de manhã o Classroom/Meet e a tarde o Teams. O que é isso? Foi minha primeira pergunta e também a pergunta deles. “Bem é nossa sala de aula. Um espaço virtual que vai nos unir. Eu agora vou estar na sua casa e você vai estar na minha. E todos nós vamos nos ver e aprender muito juntos”. Foi assim minha primeira conversa comigo e com eles, com as crianças.

Comecei a estudar, bem mais do que antes. Precisei aprender as ferramentas, a linguagem e como funcionava. Precisei aprender outras metodologias e contei/conto com ajuda de muitos(as) amigas e amigos. Percebi que o Covid-19 nos afastou e nos uniu. De repente, vi crescer uma rede imensa de solidariedade, principalmente, entre professores (as) e famílias.

Depois de estudar, pensar, formular... percebi que precisava inserir o meu contexto de sala de aula neste universo, considerando duas grandes questões: a qualidade do ensino precisa ser a mesma ou melhor; e a adequação das metodologias e ferramentas para o nível de idade e aprendizado das crianças. Então, comecei a planejar minhas aulas. Tudo precisava ser muito lúdico. Na sala de aula presencial nós tínhamos os “combinados”, nossas regras para a aula acontecer. Bem, adaptei. Então, fiz umas plaquinhas com símbolos explicando nossas regrinhas, como deixar a garrafinha de água perto, desligar o microfone enquanto a tia falar, ligar o microfone quando a tia pedir, antes de começar a aula lavar as mãos e deixar o material escolar perto. Todos os dias são testes. Aprendendo o que funciona ou não. Tento manter a interatividade com eles. Converso, peço para vê-los. Peço que me mostrem o que estão fazendo, mostrem as atividades. Não diferente da sala, chamo cada um pelo nome, pergunto as novidades e como estão se sentindo.

Mantemos, eu e eles o nosso calendário. Todos os dias, marcamos a data do dia da semana, conversamos sobre o dia. Todos têm participado e buscamos aprender e nos divertir. Percebi que é importante não deixar que eles fiquem parados muito tempo. Então, as atividades estão sendo pensadas para que eles se levantem, se movimentem, que busquem objetos pela casa com atividades/brincadeiras quanto ao conteúdo, tal como, aprendendo o som das letras. Peço que identifiquem um objeto da casa que inicia com a letra, que traga e apresente aos colegas. Com isso, eles identificam o objeto, relacionam o alfabeto, escrevem a palavra, desenham a palavra e brincam com os colegas. Tenho percebido que é importante a interação, o uso de música, vídeos e jogos. Agora tudo muito curto, uma vez que o foco é menor.

Em uma das escolas, ficamos juntos duas horas com intervalo de meia hora. E na outra escola trabalhamos direto uma hora. As crianças estão respondendo as atividades e os pais são os parceiros, essenciais na ajuda das atividades, filmam, fotografam, além de interagir diretamente com os filhos na aula.

Os obstáculos são imensos e todos os dias temos novos desafios, mas sinto que estamos aprendendo muito, estamos mais solidários e mais cuidadosos uns com os outros. Estamos aprendendo o valor de uma coisa muito simples, estamos aprendendo a importância de estar perto e o valor do “toque”.

Sayonara Mirley
Graduada em Pedagogia
Especialista em Educação Infantil
Professora da Educação Fundamental Menor

terça-feira, 5 de maio de 2020

para além do Acesso Remoto, Quem somos?

Hoje são 02 de maio de um ano que nem sequer começou direito, do ano de 2020. São tantas questões que se colocam para refletir e pensar neste momento, mas pra começar, precisávamos escolher uma. E chegamos à conclusão, a educação para além do acesso remoto. 

Não precisava ser professora para saber todos, ou quase todos os problemas que existem referentes ao sistema educacional em nosso país, principalmente agora, nesse momento tão delicado. Acredito que ninguém da minha geração imaginou viver uma “pandemia planetária”. E essa ideia de falar sobre isso não surgiu porque estamos em casa confinadas, apenas colocando a conversa em dia por redes sociais, pelo contrário, surgiu por estarmos imersas a uma gama de afazeres e demandas de trabalho, talvez nunca antes experenciados por muitos e muitas de nós, pelo menos nessa composição do Acesso Remoto, e em outros casos, a Educação a Distancia (EAD).

Com a pandemia do Covid-19 várias discussões vieram à tona, dentre elas, dúvidas e anseios. Os órgãos competentes ligados à educação começaram a articular toda uma logística sobre o que deve ou pode ser utilizado nos seguimentos educacionais. Estas discussões levantam questões muito pertinentes, tais como o uso da EAD para suprir as aulas presenciais. Qual é a grande questão? A grande questão é: todas as pessoas (crianças, jovens e adultos) possuem condições, acesso a internet e meios digitais? Esta alternativa supre as diversas necessidades ou todas as demandas que a educação exige? Será que de alguma forma, não estamos, mais uma vez, delimitando quem pode ou não pode ter acesso? Ou isso é reflexo de uma desigualdade social eminente no nosso país que a pandemia evidenciou ainda mais? Essas e muitas outras questões de extrema relevância se tornam urgentes na pauta da educação, sendo mais comprovadas nesse momento, e não poderia ser diferente, por todos os fatores que conhecemos. 

A metodologia do Ensino a Distância é uma possibilidade e um caminho, e embora seja eficiente, não tivemos tempo de aprender e nos preparar. A EaD representa a inovação, a tecnologia e o acesso à Educação. Desde sua origem foi criada com a finalidade de dar acesso. No entanto, nossa realidade social não é assim estruturada, e a adaptação precisava ter sido pensada e analisada com cuidado, mas não tivemos tempo. As exigências foram impostas e essa preocupação legítima pode ser mais agravada pela “Guerra” Ideológica e cultural instaurada mesmo antes da pandemia, tornando-se agora um grande pavio de pólvora.

E além de tudo isso, os “bastidores” desse cenário não são pontuados. Trata-se do “ser humano e suas fragilidades”, discentes e docentes vivenciam de forma mais efetiva e afetiva suas emoções, tristezas, preocupações, inseguranças, ansiedades, entre outros sentimentos que estão à flor da pele. Não, não estou falando mais de preparar material, conhecer plataforma, estudar estratégia, estudar o conteúdo, formular questões... Não, não são estas funções que me refiro agora. Estou falando do oficio da professora enquanto “lugar de paz”, espaço de “escuta”. 

Para além de todo o cenário retratado, agora no final de abril começamos a atender ligações e receber mensagens revelando uma nova estatística do governo, a que vem com nomenclatura. Os números se tornaram nomes. São mães, pais, filhas, filhos, tias, tios, avós, avôs, amigas, amigos... Agora, no final de abril, percebemos que no exercício da nossa função não chegávamos apenas na casa dos (as) nossos (as) alunos (as). Não mais víamos “só” os detalhes da casa ou conhecíamos a família, agora entramos na categoria de quem conforta, de quem escuta, de quem se configura de esperança, de quem se transforma em confiança... Nossa função agora se reveste de humanidade. 

Esse exercício de compartilhar, de doar e de construir conhecimento, mesmo já fazendo parte da rotina dos professores e professoras, agora se amplia em um processo muito maior e muito mais humanizado. Nosso olhar se expande a cada ausência na tela do computador. E não é diferente das tecnologias que estamos aprendendo a usar, estamos aprendendo quem somos por dentro. Estamos aprendendo de maneira intensiva sobre o “outro”, sobre “respeito”, sobre “dores”, sobre esse “amor tão desmedido”, na verdade nem sabemos explicar muito bem. 

Nossa função de construir conhecimento se ampliou para além do acesso remoto. Estamos experenciando filosofias estudadas uma vida inteira. Testando teorias e entendendo que muito mais amplo que nosso conhecimento teórico e prático de formação é a nossa capacidade de “olhar” o outro. Não me refiro a “ver”, me refiro a olhar. Olhar com cuidado, olhar com respeito, olhar com solidariedade. Nossa função agora se transformou em um exercício constante de aprendizado. Estamos aprendendo sobre limites, controle, respeito e companheirismo. Estamos enfim, aprendendo muito mais sobre pessoas. Essas questões muitas vezes ficam perdidas ou despercebidas na correria constante dos nossos dias, mediante a grande demanda de atribuições, e na Educação, seja pública ou privada, ensino básico ou superior, não é diferente. 

E o futuro? Não fazemos ideia do que será o futuro. Sabemos que iremos enfrentar o trauma Pós-Covid-19. Ninguém colocou na agenda de 2020 tamanha excepcionalidade ou se preparou para enfrentar esse caos que o mundo vivencia. Lidamos com a incerteza de tudo, com a fragilidade e os medos. São tantas particularidades para poucas prioridades que a professora de história sai do tangível e mergulha no intangível, se tornando a “linha de frente”, que mesmo se sentindo impotente cuida da fragilidade do outro. Ressalto que esta não é uma práxis que encontramos em livros ou artigos acadêmicos, nem para isso estávamos preparadas, por isso a intenção não foi de produzir um texto com citações de teóricos e pesquisadores da educação e áreas afins, mas expressar o que estamos vivendo, sentindo e percebendo em nós, professoras e no outro, nossos (as) alunos(as) e suas famílias. É no espaço de trabalho, no ambiente educacional, que todas as fragilidades sociais em suas mais diversas faces, desaguam, e como em curso contrário, grita e implora para voltar ao seu fluxo natural. E quem somos nós? Somos apenas, professoras, para além do Acesso Remoto. 

Cinthia Cecília de Lima
Graduada em História e Especialista em História da Paraíba
Professora de História da Educação Básica
Presidente da ONG Memória Viva
Membro com conselho Municipal de Educação

Márcia de Albuquerque  Alves
Graduada, Especialista e Mestra em História
Professora do Ensino Superior Privado 
Membro da Academia Paraibana de Letras, 
Ciências e Artes do Vale do Mamanguape - ALCA

Você sabe o que é Racismo? – Relato de uma Professora de Literatura em Aula de Acesso Remoto

“Não tive filhos, não transmiti a nenhuma criatura o legado de nossa miséria”. Você sabe o que é racismo? Isso mesmo, início a minha fala en...